Entrevista:
Quem és?
A ordenação de tudo o que É, o princípio feminino que é matriz de toda a Realidade, impulsionado pelo princípio masculino da realiz-Ação. Mas essa foi uma simplificação bem ordinária, apenas adequada ao momento.
De que és feita?
Sou feita do manifesto e do imanifesto, mas que também se manifestará um dia, com base nas ações e reações, causas e efeitos, performatizados por todas as consciências que são partes de Mim. Sou feita também daquilo que já se manifestou mas não se manifesta mais.
Hãn?
Sim, o que já existiu também repousa no meu ventre de morte e transmutação. Repousa também por hora, porque em breve tudo o que existiu será chamado a existir novamente, mediante outra roupagem e propósito, oitavas acima ou abaixo, talvez acima E abaixo em diferentes tempos e espaços, também meus. Movem-me as escolhas, em seus infinitos graus que vão da consciência plena à inconsciência total, ambos extremos jamais conhecidos pela humanidade – apesar de muito referenciados.
Pareces ser muita coisa, moça. Não consigo imaginar uma forma conhecida que abarque tudo o que és. Por que então te chamam Roda?
Você já viu uma Roda funcionando em altíssima velocidade? Pois bem, decerto haverá percebido que ela praticamente desaparece, mas ninguém pensa em se perguntar, ao ver um carro que segue à toda, se a Roda de fato ainda está lá. Deixo a seu cargo e a cargo dos leitores e leitoras imaginar essa imagem aplicada à natureza do Todo. Além disso, cada ponto da Roda, ainda que permaneça o mesmo ponto, toca a estrada em um lugar novo, sempre diferente do anterior. Isso, claro, quando se Destina a algum lugar. Ela atravessa seu caminho reto de modo espiralado, e “desaparece” no meio do caminho, embora seja a ferramenta-motriz de quem tem aonde chegar. Ou o que criar. Tem qualquer coisa de divina, a Roda.
Preciso meditar sobre isso. Porém, enquanto a ouvia, me tomou de assalto outra dúvida: não posso deixar de imprimir à sua voz uma expressão feminina, ainda que reconheça na sua atuação ambos os princípios, masculino e feminino. A esse respeito, o que me podes esclarecer?
Para isso ofereço uma nova imagem, se me permite.
(…)
Me permite?
Claro! Pensei que a permissão estava subentendida.
Mas é claro que está. A minha permissão para atuar está sempre subentendida. Atuo desde sempre e para sempre, e minha Ordem está presente ainda quando as consciências individuais não a podem reconhecer, pelos limites de suas próprias mundividências. Contudo, ainda que isso seja a Verdade, faz muita diferença quando essas consciências individuais, na presença consciente da Verdade, optam por ela. Há quem, inclusive, parta dessa premissa para caminhar na Magia.
Sendo assim, permito o uso da imagem que intencionas.
E eu agradeço, meu querido. Agindo assim, permitindo-se novas imagens, você contribui para a expansão da Lux no todo da Criação. Oferece generosa abundância à Beleza, abrindo o ambiente da sua psique à inebriante inspiração das musas. Misericordiosa Vitória.
Imagine uma criança brincando de bambolê. Ela envolve com ele a própria cintura e em seguida, com um impulso, coloca o bambolê para girar. Ela sabe que o impulso inicial não será suficiente para manter o bambolê girando, e nem seu corpo ereto e endurecido permitirá o fluxo. É preciso conduzir o movimento do bambolê com a flexibilidade do próprio corpo, começando pela cintura e estendendo-se por todo lugar por onde o bambolê queira passar. Flexibilidade, movimento, dança. É aí que eu, a Roda, me encontro consigo, a pequenina consciência individual.
Dessa imagem decorre uma premissa que é fruto e também semente no inconsciente coletivo que caracteriza seu período histórico e cultural, mas não outros, e talvez não mais por muito tempo: quando pedi que imaginasse essa criança, ela era uma menina ou um menino?
Uma menina.
Pois bem. Que assim Seja.
Mas senhora, há quem imagine um menino, ou com sorte um Ser integrado!
Sim… e ainda bem que Há. E que assim também Seja.
(…)
Vejamos que vetor resultará em de fato mover a Roda.
Arte: Regras dos círculos de flexão -1993
Artista: Vernon Fisher – Americano, nascido em 1943
Desde o início da década de 1970, Fisher trabalha em um modo que pode ser descrito mais ou menos como Narrativa. Para o artista, a Narrativa é mediada entre o texto – ou uma alusão a algo verbal – e as propriedades formais da composição e das marcas. O trabalho recente de Fisher é feito com giz em painéis preparados que parecem lousas.
Créditos das imagens:
“Dancing Woman with Hoop” (1925/35) – Marcel Bouraine, 1886-1948.
Domínio público, disponível em: https://www.artic.edu/artworks/46125/dancing-woman-with-hoop
“Rules of Bending Circles” (1993) – Vernon Fisher, nascido em 1943.
Domínio público, disponível em: https://www.artic.edu/artworks/129809/rules-of-bending-circles
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